Às 21:10 da última terça-feira, 14 de janeiro, adentrei na Sala 2 do cinema da cidade.
Mais do que assistir a um filme, eu estava corrigindo um dos meus grandes arrependimentos:
Finalmente eu veria Interestelar no cinema.
Dez anos atrás, quando o filme estreou e eu morava em Florianópolis, algum comentário ou crítica na internet jogou por terra toda a minha vontade de ver o filme no cinema.
Meses depois, quando consegui o Blu-ray emprestado com os russos, o arrependimento veio:
Era um dos filmes favoritos da minha vida.
E eu tinha perdido a oportunidade de vê-lo em uma tela grande por causa de alguma frase de alguém que nem me lembro.
Dez anos depois, o filme volta ao cinema para uma breve reexibição em comemoração ao seu aniversário.
Descubro de última hora e compro um dos últimos pares de ingressos. Sala cheia, silêncio total — a não ser pelas lágrimas ocasionais causadas pela impiedade do tempo.
Ao final da catarse coletiva, palmas. Para um filme lançado dez anos atrás.
(Já adianto que disso eu não participei. Me parece aquelas coisas de gente que rebolam, com dizia o Bruno Tolentino ao nosso amigo Pedro Sette-Câmara. Eu estava mais preocupado em chegar logo ao guichê de estacionamento e ir direto para casa. Idosos de 33 anos não gostam de estar na rua após a meia noite.)
Mas Interestelar não foi o único filme em que isso aconteceu.
Em algum dos últimos finais de semana, assistimos aqui em casa dois filmes recentes do Ridley Scott.
Dois filmes que a crítica especializada também não teceu muitos elogios (um, pelo que me lembre, beirou ao ódio; o outro à indiferença).
Enfim, dois filmes pelos quais quase ninguém tinha muito amor: Napoleão e Gladiador II.
E, munidos de poucas expectativas (talvez nenhuma, ou apenas negativas), sentamos para assistir aos filmes e...
Gostamos.
Não da mesma forma que o Interestelar visto no cinema, mas gostamos.
Não que os filmes não tivessem problemas, que os roteiros não cometiam seus pecados (às vezes por falta, às vezes por excesso), mas gostamos.
Passamos nosso tempo. Foi um bom divertimento. Voltamos a nos interessar pela História. Procuramos descobrir o que, no meio daquilo, era real e o que era ficção.
Até conversas inesperadas com amigos distantes esses filmes renderam.
Muito longe, portanto, de uma perda de tempo.
Mas foi exatamente isso que me fez perder qualquer vontade de ver qualquer um deles no cinema:
Seria uma perda de tempo.
E quando olho assim, no conjunto das experiências, não posso deixar de me questionar:
Por que temos tanto medo de "perder tempo"?
Ou melhor: o que seria esse "perder tempo"?
É uma outra forma de ser improdutivo?
Porque, com todos esses filmes que seriam apenas "perda de tempo", eu só tive a ganhar.
Essa é a parte do texto que pede por uma citação do Byung-Chul Han e do seu livro Sociedade do Cansaço, mas não a farei porque faz tempo que li o livro e lembro pouco de seus conceitos, mas acredito que há algo ali que faria sentido com o que está aqui.
Talvez algo como temos tantas cobranças interiores, tanta ânsia de "ser a melhor versão de nós mesmos", que não nos abrimos mais à experiências que podem, à primeira mão, nos fazer perder tempo.
Nos fechamos dentro do que “parece certo, seguro” e nem nos abrimos mais à possibilidade do inesperado.
É por isso que nossas viagens ao exterior possuem destinos e cronogramas milimetricamente projetados.
É por isso que assistimos aos vídeos e aulas no 2x, mal conseguindo entender e — perdoem-me a palavra feia — absorver o que estudamos.
O tempo é curto, não temos tempo a perder.
Mas é assim que, com medo de perder tempo, acabamos por perder a própria vida.
Um abraço,
Catapan.
P.S.: O primeiro livro do ano foi uma grata surpresa e uma bela companhia: O Deus Oculto no Canto do Córner, do escritor brasileiro Milton Gustavo. Se você gosta dos filmes de boxe (Rocky, Creed), vai adorar. Se não gosta, vai ler as 216 páginas na mesma voracidade.
P.S.2: A segunda temporada de Ruptura está prestes a estrear e resolvemos rever a primeira leva de episódios em preparação. Acho que isso vale por uma entusiástica recomendação.
P.S.3: Fiz uma lista dos livros que gostaria de ler em 2025 e, até o momento, ela tem sido completamente ignorada. Estou lendo o que me dá vontade, para ser sincero. Os tempos da obrigação ficaram na faculdade.